O sumiço de Pitica

 Nós gostamos muito de novidades contudo, por conta dos outros seres viventes neste ambiente, fomos adotando algumas rotinas. Normalmente quem alimenta as galinhas é o Domenico, principalmente pela manhã, pelo simples fato de que ele se levanta todos os dias às 5h, já eu... Como andei contando por aí, a Pitica, nossa garnisé, bate as asas do galinheiro e alça voos pelo quintal. Ela é quem aparece debaixo da janela cacarejando em alto e bom som solicitando o café da manhã. Ora, dia desses o Domenico não estava e a missão de alimentar a bicharada foi minha. Saio feliz para o quintal e... cadê Pitica? Aves em griteiro estridente pois eu estava atrasada. Olho, faço o costumeiro balançar do potinho de comida e nada da pequena. No fim do dia ela também não apareceu para jantar. Chorei porque a minha musa inspiradora havia desaparecido. Acionei minha imaginação criativa e tive certeza de que ela havia escapado pelo portão. Pensei melhor. Isso não seria possível pois o Domenico é muito mais prudente do que eu neste quesito de manter o portão fechado. Talvez alguém tenha passado e sem resistir aos seus encantos galináceos a surrupiou descaradamente. Bom, isso também era pouco provável pois, pela estrada, lá se vão numerosas galinhas em desfile e ninguém se importa. Por mais que ache a penosa uma graça, ela não é exatamente a Gisele Bündchen do galinheiro.  Meu coração deu um salto para um pensamento mais cruel, e se uma jiboia engoliu a pobrezinha. Lembrei-me de que aqui não há jiboias. Não que eu saiba. Será? Eu, rainha coroada do drama, dormi arrasada, mastigando o pensamento “E agora, quem irá inspirar minhas escritas?”

Dia seguinte lá vem a Pitica, bela e formosa ciscando o quintal e pedindo o desjejum. Foi então que Domenico me revelou que isso acontece com alguma frequência. Mirei minha mente inventiva para outros cantos e pensei: será que ela está encontrando o galo do vizinho às escondidas? Será que está ciscando em terreiro alheio? Será que está chocando? A terceira hipótese pareceu muito plausível. Preciso dizer que a Pitica aparecia do nada e para o nada retornava. Era tão ágil que não conseguíamos observar de onde surgia e para onde ia. Passei a buscá-la incessantemente pelo quintal. Ora, ora, temos uma galinha com penas em tons de terra e estamos no inverno, onde quase tudo ganha a mesma paleta de cores, o que tornou a minha missão impossível. Procurei em cada canto, arbustos, árvores, folhas secas, pilastras, buracos, sem sucesso. Exercitava aquela famosa ideia “se eu fosse uma galinha onde eu me esconderia?” e rumava em nova direção.


Hoje, pela hora do almoço, Domenico me perguntou “E perto das bananeiras, você procurou?”. Não, não tinha procurado. Tão próximo à porta da cozinha, mas, foi o único lugar que, por algum mistério eu não olhei. Isso após revisitar todos os recantos milimétricos do quintal. No fim da tarde, fui alimentar a galinhada e espiei nos cantinhos da bananeira. E não é que a encontrei, camuflada entre as folhas secas. Lançou um olhar como quem pergunta “Não tenho sossego nessa vida não?”. Permaneceu imóvel. Tinha aquela pose e o ar de galinha que está chocando, mas, isso é um mistério que só conseguirei solucionar da próxima vez que ela se levantar para uma refeição. Por enquanto, agora que meu coração encontrou shakeaspereano encontrou sossego, deixemos a pequena em paz.

Comentários

Postagens mais visitadas